FuncionAL - Com vocês, Vitória


26/07/2018 16:54 | Entrevista | Natacha Jones - Fotos: José Antonio Teixeira

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Vitória Frugoli<a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/N-07-2018/fg226151.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a> Vitória Frugoli<a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/N-07-2018/fg226150.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a> Vitória Frugoli<a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/N-07-2018/fg226148.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a>

Ela conduziu diversos embaixadores nas visitas ao Palácio 9 de Julho e acompanhou momentos de destaque na história do Parlamento. Organizou grandes funerais que abalaram o Brasil, como o do piloto Ayrton Senna. Recepcionou o icônico líder sul-africano Nelson Mandela em 1991, logo após ter sido libertado de seu cárcere, quando visitou a Assembleia Legislativa.

Vitória Thereza Frugoli, de 77 anos, tem muita história para contar. Prestou concurso para a Alesp há 30 anos, e iniciou sua trajetória no Serviço de Cerimonial. Ela relembra o enterro de Ayrton Senna e diz que todos da Casa estavam envolvidos nos preparativos; foi responsabilidade do cerimonial preservar ao máximo a família e os parentes. "Até o então presidente da República Itamar Franco veio, e eu tive de barrá-lo. Imagina a situação? Isso porque a família tinha pedido para ficar 30 minutos a sós com o corpo. Concedemos o pedido e foi bem no momento em que o presidente chegou e precisei impedi-lo de entrar", relata.

Quando o plenário Juscelino Kubitschek recebeu Nelson Mandela para uma homenagem, Vitória estava lá. E conta quando sua esposa, Winnie, pediu um lugar para ele descansar durante alguns minutos. "Isso porque o Mandela ainda sentia fisicamente o desgaste dos longos anos em que ficou preso, a sua saúde ainda precisava de cuidados." O ex-presidente da África do Sul realizava sua primeira viagem ao Brasil, e veio acompanhado de comitiva composta por sete pessoas. "São momentos que trazem peculiaridades em que você enxerga a mescla entre o homem e o seu papel político e social", diz.

Brasil - Itália

Nascida no Brasil e neta de italianos, Vitória morou na Itália durante cinco anos - de onde traz a intimidade com a língua do país. Ela era criança e conta que nessa época sentia muita saudade por ter deixado amigos, colegas de escola e os pais, que não a acompanharam. "Viajamos com os nossos avós. Com o tempo você vai se acostumando, mesmo a escola lá sendo bem diferente, de freiras e muito rígida. Ademais, saí da escola de Santos, que era imensa, e mudei para uma escola minúscula", fala.

Vitória chegou na Itália logo em seguida ao final da Segunda Guerra Mundial, em 1945. "Quando chegamos, as pessoas tinham passado fome e várias dificuldades, e vieram nos receber com bandeirinhas. Acharam que nós éramos americanos e tínhamos chegado para salvá-los da pobreza. Eu nunca tinha visto algo igual", lembra.

No retorno ao Brasil, Vitória fez o exame de adaptação no Colégio Dom Pedro, porque não sabia falar português e não conhecia a história do país. "No fim das contas, eu passei no exame e comecei a frequentar a escola aqui normalmente", explica.

Ela formou-se normalista em 1960, e trabalhava na área quando decidiu prestar o concurso da Alesp.

Carreira e aposentadoria

Nos primeiros anos da história de Vitória na Assembleia, as solenidades eram bem diferentes das de hoje. Ela cita, por exemplo, as ocasiões em que o presidente da Casa recebia os embaixadores. "Eles vinham para o Brasil, visitavam o governador e depois vinham aqui. Colocávamos a bandeira do país estrangeiro no estacionamento e o tapete vermelho - que na época era só para o embaixador - no Hall Monumental. O presidente ficava em sua sala e quando se ouviam as sirenes das motos significava que o embaixador estava chegando. Só então o presidente saía para recebê-lo na porta de vidro, como alguém que recebe uma visita em casa."

Seguindo o protocolo, a Camerata da Polícia Militar tocava o hino do país visitante, e depois o brasileiro. "Eu me lembro de uma embaixadora de Israel (Tzipora Rimon) que chorou, alegando que nunca tinha sido recebida como aqui, ficou feliz", conta.

Os debates que precederam a criação da Constituição de 1988 também tiveram o testemunho de Vitória. "Aconteceram várias situações atípicas. Os deputados viravam a noite no plenário, todas as mesas foram para lá. Todo mundo trabalhava direto, noites e noites a fio." Por outro lado, ela conta que quando o trabalho foi concluído houve muita comemoração com gritos e papéis jogados para cima.

Segundo ela, o setor de fotografia da Casa era um evento à parte: tudo era feito manualmente e os fotógrafos corriam para registrar o momento e, ao mesmo tempo, preocupavam-se porque precisavam revelar as fotos. "Eles as empilhavam no canto da parede e usavam o ventilador para secar mais rápido. Tudo isso para conseguir utilizá-las no Diário Oficial do mesmo dia."

Além do cerimonial, Vitória também trabalhou na presidência da Alesp. "Eu participei da gestão do deputado Vitor Sapienza. Assim que assumiu, ele me chamou."

No período da presidência do deputado Fernando Capez, os eventos artísticos e culturais da Casa estavam sob sua responsabilidade. "Nós combinávamos exposições e músicas como a Orquestra de Sinos, um coral com mais de 300 vozes que se apresentou no Hall Monumental. As exposições de arte espalhavam-se nos principais espaços da Alesp", afirma.

Em 18 de maio de 2011, véspera do aniversário de 70 anos, Vitória aposentou-se.

Cuidado com os animais

A aposentadoria não a afastou da Alesp. Ela desenvolve serviço voluntário na Associação dos Servidores Aposentados e Pensionistas (Aspal), cuja sede fica no Palácio 9 de Julho, e dá apoio a grupos e instituições que cuidam de animais abandonados. O apoio aos animais começou há 17 anos, quando apareceu na Assembleia uma cachorrinha precisando de cuidados. Vitória cuidou, tratou e apelidou-a de Nêga - que viria a se tornar mascote da Casa.

Os anos passaram e Nêga morreu em decorrência da idade. Mas há dois anos, outra cadelinha, a Nina, apareceu no estacionamento da Alesp. Seu antigo dono, um morador de rua, havia acabado de ser levado pela polícia, deixando-a sozinha.

Vitória disse que foi difícil conquistar a confiança da cachorra. "Foi preciso um biscoitinho daqui e outro dali, aos poucos ela foi acostumando-se com as pessoas que trabalham aqui", diz.

Hoje a vira-lata mora próximo ao posto do Detran da Alesp, onde recebe visitas, que se solidarizam para garantir sua comida, água fresca, cama quentinha e carinho. "A Nina nunca fica sozinha. Aos fins de semana, por exemplo, os bombeiros fazem plantão e sempre cuidam dela. Ela faz todas as sujeiras na parte de fora, até nesse aspecto ela é educada", diz a aposentada.

Frugoli também ajuda nos bazares e rifas realizadas por uma instituição que resgata e cuida de cães da raça pit bull maltratados, ajudando na arrecadação de fundos utilizados na recuperação de sua saúde. "Na inundação que ocorreu em Petrópolis/RJ, muitos cachorros ficaram perdidos e abandonados e arrecadamos muita coisa. Alugamos um caminhão para transportar as doações e acompanhamos a entrega, para garantir que chegasse exatamente onde era preciso", conta.

Vitória recebeu dois prêmios em sua vida funcional. O Prêmio Loba Romana, criado pelo deputado Vitor Sapienza em 1988. "Era concedido no dia da comemoração da colônia italiana no Brasil", conta. E a Medalha de Nove de Julho, que agraciava os melhores servidores da Casa.

Após 30 anos, ela diz que aprendeu muito e o tempo todo. "Hoje, a vida é outra e o tempo muda tudo, muda até as pessoas. Temos de encarar e viver dentro de todas as mudanças, não esquecendo quem somos e respeitando a nossa essência. Fiz e faço o que gosto. Sou feliz na Assembleia e estarei aqui até quando me permitirem".


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