O todo e as partes


02/05/2007 20:19

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Antonio Carlos<a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/03-2008/antonio carlos02.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a>

Quem lida com a administração pública de uma forma séria e reflexiva logo aprende que tão importante quanto fazer é a forma pela qual se faz. Uma obra importante, feita com todas as qualidades técnicas não será totalmente satisfatória se a comunidade preferisse que os recursos fossem utilizados em outra coisa. Da mesma forma nenhum projeto é capaz de ser bem sucedido se não é capaz de encontrar quem convença a sociedade da sua importância.

Pensar assim não significa que o homem público deva ser mero executor das vontades da sociedade; afinal foi por ver nele as qualidades de liderança que a comunidade o elegeu. Nem que deva deixar de lado as questões técnicas, porque elas são necessárias para a otimização dos benefícios e para garantir que cada projeto seja executado da forma mais barata possível.

Gosto de comparar esta dimensão da liderança ao "tempero de mãe", ou seja, àquele detalhe que não está na receita mas que é o que dá sabor especial ao prato. Penso que sua essência é a capacidade de ouvir os diversos segmentos, compreender as demandas, buscar soluções adequadas, ter a compreensão da importância do convencimento e do diálogo com a sociedade e, acima de tudo, ter a humildade necessária para entender quando e quanto a idéia original pode ser aprimorada pela população.

Digo que esta é uma dimensão imponderável porque uma sociedade é muito mais que a soma das suas partes. Da multiplicidade de interesses, necessidades e propostas que surgem de cada segmento é preciso achar o ponto de equilíbrio plausível, capaz de ser executado. O poder público não é onipotente, não pode resolver tudo sozinho; assim conquistar o apoio da sociedade é aspecto essencial da boa administração.

Quando a força da sociedade é mobilizada em torno de algum projeto que ela acredita os resultados demonstram na prática o fato do todo ser maior que as partes, realizando atividades que nem se acreditava possível. Só para citar um pequeno exemplo da minha vida, quando assumi o primeiro mandato como prefeito de Caraguatatuba havia uma situação caótica. Poderia ter me escondido atrás das lamentações e distribuir culpas. Preferi, contudo, mobilizar a sociedade para vencer o desafio, em particular nas áreas mais críticas.

Foi assim que, em plena estação turística, a comunidade participou de um imenso mutirão para resolver a situação do lixo na cidade. Em poucos dias a cara da cidade mudou graças aos amigos e à sociedade civil organizada. Também foi organizado um mutirão nos finais de semana para pagamento do IPTU, no qual a população deu uma demonstração de empenho e confiança, permitindo assim que a situação financeira crítica da prefeitura fosse atenuada.

É evidente que a mobilização da sociedade só pode alcançar todo o seu potencial quando há uma "cultura cívica"; quanto mais há noção ativa de cidadania, compreendendo direitos e deveres, melhores condições uma sociedade tem de fazer frente aos seus desafios. Também, por isto, uma das minhas grandes preocupações em Caraguatatuba foi com a educação.

De um lado era necessário transformar a bandeira de "nenhuma criança fora da escola" em uma realidade. De outro era necessário garantir que a escola pública atingisse um padrão de qualidade capaz de garantir a sustentabilidade do futuro da cidade. Assim, investiu-se maciçamente na formação de professores, inclusive com bolsas para graduação, mestrado e doutorado, na construção de salas de aula, laboratórios de informática, bibliotecas, brinquedotecas e ginásios poli-esportivos. Mas também, como elemento fundamental, envolver as famílias no processo todo, desde a pré-escola.

Destaco que a melhor obra, daquelas criadas nos laboratórios dos marqueteiros, muitas vezes pode acabar tendo um efeito ruim, na medida em que nelas não há a preocupação em fazer a sociedade compreender que ela é o agente da mudança, não apenas seu objeto. É por isto que creio que a forma de fazer qualquer coisa é tão importante quanto o que é feito. Pode-se reforçar a cidadania e consolidar a cultura cívica envolvendo a sociedade ou apenas ser mais um que passa a mensagem que o poder público tudo pode, tudo faz.

*Antonio Carlos, empresário, é deputado estadual pelo PSDB, foi prefeito de Caraguatatuba por dois mandatos e Diretor Técnico do CDHU.

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