Bloqueio de celular é eficiente por tempo curto, afirmam especialistas

Os custos do sistema de bloqueio de sinal e os prazos para sua implantação não foram discutidos na audiência
24/05/2006 21:00

Compartilhar:

Audiência pública da Comissão de Cultura, Ciência e Tecnologia <a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/03-2008/ComCiencia086 rob.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a> Ana Gabriela Marques da Silva e deputada Célia Leão<a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/03-2008/ComCiencia gabriela rob.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a> Francisco Giacomini, gerente-geral da Anatel<a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/03-2008/ComCiencia Francisco(Anatel) rob.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a>

O bloqueio do sinal de telefones celulares nas áreas de presídios pelas operadoras de telefonia móvel, recentemente determinado pelo Tribunal de Justiça paulista, foi discutido em audiência pública da Comissão de Cultura, Ciência e Tecnologia da Assembléia Legislativa, presidida pela deputada Célia Leão (PSDB).

A possibilidade técnica e a eficiência da medida foram analisadas por representantes da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) e das operadoras Claro, Vivo, Tim e Nextel, além de técnica da área de engenharia da Secretaria de Administração Presidenciária e de membro da Associação de Engenheiros de Telecomunicações de São Paulo. Os custos do sistema de bloqueio de sinal e os prazos para sua implantação não foram discutidos.

Na opinião geral dos participantes, é difícil não prejudicar a qualidade dos serviços e limitar o bloqueio ao lado de dentro dos muros das prisões sem interferir com a área circunvizinha. Além disso, sistemas que usam radiocomunicação para monitoramento de rodovias ou de frotas de transporte também podem ser prejudicados.

Francisco Giacomini, gerente-geral da Anatel, fez uma longa exposição sobre o tema, incluindo pesquisa sobre países onde o sistema é utilizado. Nos EUA, o bloqueio de sinal é ilegal, enquanto na Inglaterra e na Bolívia é permitido somente dentro da área do presídio, por exemplo. O expositor abordou aspectos técnicos do Bloqueio de Sistema de Radiocomunicação (BSR), cujos modelos disponíveis, de diversos fabricantes, foram testados pela agência em 2001, com resultados satisfatórios em presídios de São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro. Entretanto, disse Giacomini, a evolução tecnológica, muito dinâmica e rápida, torna qualquer equipamento desse tipo obsoleto se não for atualizado em processo contínuo. Como exemplo, demonstrou que, em 2001, o número de faixas de freqüência em que operavam os celulares era praticamente a metade das faixas em operação hoje.

Além disso, o representante da Anatel acrescenta que novos sistemas já funcionam ou virão a funcionar em breve, como o wi-fi (comunicação sem fio), wimax (conexão de alta velocidade sem fio) ou VoIP (comunicação de voz pela Internet ou por redes IP), por exemplo. Ele questionou que se dê às operadoras do serviço a responsabilidade de "não prestá-lo".

Limitação do sistema

Outro problema apontado pelo representante da Anatel é a limitação do bloqueio ao presídio sem atingir áreas circunvizinhas. Para ele, cada presídio tem sua especificidade, tamanho, potência da telefonia local etc., o que enseja um projeto próprio e a tentativa de minimizar eventuais prejuízos aos usuários de fora dos muros.

Essa particularização para cada um dos presídios também impede que se informe um preço padrão único para os sistemas de bloqueio, segundo Giacomini. "O bloqueio de celular é uma coisa que pode ser usada, mas pode não funcionar em 100% dos casos", afirmou.

Apesar de o bloqueio de sinal em presídios haver sido determinado pela Justiça, a regulação da Anatel já prevê essa situação. Três resoluções da agência " 305, 306 e 308 de 2002 " dispõem sobre o BSR, o que quer dizer que o assunto não é novo.

Gaiola de Faraday

Muito comum e recorrente após rebeliões em presídios, a técnica de cercar a construção com tela metálica, a chamada Gaiola de Faraday (blindagem elétrica destinada a impedir perturbações no campo elétrico ou eletromagnético), que seria "simples e barata", foi desmistificada por Paulo Emídio Faria, da operadora Vivo. Ele explicou que hoje as freqüências utilizadas pela telefonia móvel celular são muitas e muito altas, o que faria com que a tela tivesse de ser muito fechada para impedir o sinal (furos de 1 a 1,5cm). De outra parte, já existe legislação a respeito: a Lei Federal 10.792 dispõe, nos artigos 3º e 4º, que as penitenciárias devem bloquear o sinal de radiocomunicação.

Para o representante da operadora Claro, Artur Skinner, mais lógico que bloquear o sinal seria inibir o acesso ao serviço, tecnologia disponível da própria empresa que seria mais benéfica. Skinner explica que o bloqueio acaba impedindo comunicações importantes, como as de monitoramento de frotas, de rodovias etc.

Conceito de comunicação móvel

As comunicações móveis extrapolam o telefone celular, que é apenas o mais difundido. Muitas outras tecnologias compõem a comunicação sem fio, que podem ser instaladas sem dificuldades por qualquer pessoa, segundo Gil Odebrecht. "Hoje, essas tecnologias passam muitas vezes por freqüências não licenciadas e são utilizadas para a mesma finalidade do celular", disse ele. Entretanto, para as novas tecnologias, não há controle legal. Isto é, o bloqueio de um tipo, como o celular, não impede a comunicação por meios novos ou por outros que ainda surgirão. Por isso, a manutenção (entenda-se atualização) do sistema de bloqueio é tão importante quanto a instalação.

A Nextel, representada por Alfredo Ferrari, também participa com a Anatel do projeto de bloqueio. Na penitenciária de Bangu, funcionou, em 2001, mas sem manutenção deixou de ser eficaz. Qualquer bloqueador, segundo Ferrari, terá impacto sobre a qualidade do serviço, por mais cuidadoso que seja. Ele reforça que novas tecnologias surgirão e o sistema ficará obsoleto em curto espaço de tempo.

Evolução rápida

Antonio Zuffo, professor da Escola Politécnica da USP, engrossou o coro das novas tecnologias, cada vez mais freqüentes e mais baratas, o que as torna mais disseminadas. Para ele, qualquer sistema de bloqueio tem custo baixo, e tende a baixar mais ainda. Zuffo se propôs a demonstrar valores, mas a internet estava fora do ar e não foi possível acessá-la até o final da reunião. Ralph Heinrich, do Centro de Pesquisas e Desenvolvimento em Telecomunicações (CPqD), acredita que o maior desafio é instalar o sistema adequado ao presídio, atualizá-lo constantemente e protegê-lo do vandalismo a que estará sujeito em todas as oportunidades. "Assim que se coibir o uso do celular, outras tecnologias surgirão para esse fim", disse. "Estamos caminhando na contramão da tecnologia."

Denúncia

Ruy Bottesi, da Associação de Engenheiros de Telecomunicações, acusou a Anatel de eximir-se de sua responsabilidade com usuários e operadoras. Ele afirmou que a agência renova contratos de telefonia fixa sem verificar o cumprimento de metas pelas empresas, entre outros problemas.

Segundo Bottesi, a AET entrou com um pedido de intervenção na Anatel, mas antes que pudesse esclarecer quem interviria, sua participação foi questionada pelo deputado Adriano Diogo. Segundo Diogo, a pauta aprovada pelos membros da comissão definia os participantes e a AET não fazia parte.

O deputado Jonas Donizette (PSB) lembrou a declaração do comandante-geral da PM, coronel Eliseu Éclair, de que estamos em guerra contra o crime e comentou: "Na guerra, um dos instrumentos principais é a comunicação". Para o parlamentar, a Comissão de Cultura, Ciência e Tecnologia tem como uma de suas missões transmitir à sociedade a noção de importância da tecnologia, o que acaba ficando difícil quando a sociedade se vê refém dessa tecnologia. "O que não pode é entrar celular na cadeia, só que não é isso que acontece. É uma falha do sistema."

O combate à corrupção foi destacado pelo deputado Souza Santos (PL). E o deputado Adriano Diogo (PT) leu trechos de reportagem publicada na revista Caros Amigos a respeito das centrais telefônicas do PCC, normalmente montadas em casas de parentes de membros da facção criminosa. São mais de 1.500 centrais operando 24 horas por dia em São Paulo. A reportagem trata também do tráfico de chips de celulares. O deputado Vanderlei Siraque (PT) também acredita que o problema está mais na corrupção e na falta de planejamento de segurança e de políticas públicas para o setor.

Não funcionou

Representante da área de engenharia da Secretaria da Administração Penitenciária, Ana Gabriela Marques da Silva trabalhou com o caso dos bloqueadores. Entre as licitações realizadas pela secretaria, citou a do presídio de Suzano, para o qual foi comprado bloqueador para todas as freqüências que operavam e de acordo com indicação técnica da Anatel. O equipamento, segundo ela, não funcionou. A Anatel contestou e ainda afirmou que na época ficou acertado que a manutenção dos equipamentos ficara a cargo da SAP.

Ana Gabriela explicou que os presídios paulistas já dispõem de detectores de metais, mas o equipamento não acusa a presença de objetos trazidos dentro do corpo. A revista, segundo ela, é rigorosa e, quando se pega alguém na tentativa de passar um celular para dentro do presídio, apreende-se o bem e encaminha-se a pessoa à delegacia. "A Secretaria da Administração Penitenciária não é polícia, não investiga e não prende", afirmou. "Estamos pedindo ajuda técnica. A SAP não cuida de telecomunicações, cuida de presos!"

A presidente da comissão, Célia Leão (PSDB), destacou o papel democrático da Assembléia, local em que os debates devem ocorrer, e considerou gravíssima a situação de São Paulo. O Estado tem 49% dos presos de todo o Brasil. Para Célia, o assunto exige um esforço suprapartidário: "A questão da segurança pública e da violência nos coloca a todos em posição de igualdade", disse, lembrando que deficiências nesse setor atingem a todos indistintamente.

alesp