A luta política das mulheres

Opinião
08/03/2006 20:13

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Deputada Rosmary Corrêa<a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/03-2008/rosmary.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a>

As palavras às vezes dizem muito mais do que querem dizer, revelam conceitos e preconceitos tão entranhados na nossa mente que muitas vezes nem nos damos conta. Basta ver, por exemplo, que o termo "homem público" é uma distinção, uma honra, enquanto o equivalente feminino do termo é um xingamento terrível, ainda que caindo em desuso. Quase meio século de voto feminino e o crescimento da participação das mulheres na política ainda não foram suficientes para banir da linguagem tal disparidade de tratamento, ainda que felizmente o preconceito contra a participação das mulheres na política esteja diminuindo de forma sensível.

A participação da mulher na política é um importante passo em uma longa trajetória que deu à mulher a condição de cidadã. Em grande medida a evolução histórica da sociedade pode ser traçada a partir das sucessivas conquistas femininas e, por que não, do ser humano. Hoje, ainda que existam ainda muito pelo que lutar, para a maioria das pessoas a igualdade de direitos está tão arraigada nas consciências que nem parece fazer poucos anos, menos de três gerações, que a mulher obteve o direito a votar no Brasil.

Ainda falta muito para que a participação da mulher nos parlamentos, por exemplo, espelhe a proporção demográfica, mas já não existe uma barreira para que a mulher seja eleita, salvo nas áreas mais atrasadas, ainda os velhos preconceito da primeira metade do século passado ainda não foram eliminados pelo avanço da educação e da cultura.

Várias pesquisas, por sinal, indicam justamente um movimento no sentido contrário, sendo considerado pro uma grande parcela da população, inclusive masculina, como um diferencial positivo uma candidatura feminina. Resultado este que sem dúvida é fruto da dedicação e do afinco que inúmeras mulheres ocupantes de cargos públicos dedicaram a suas tarefas.

As mulheres que, como eu, exerceram certo papel de pioneiras neste processo que hoje culmina com uma "quase naturalidade" em se ver uma candidata tinham consciência de que representavam não apenas a si próprias e suas eleitores e eleitores. Da imagem que elas reconstruir ao ocupar cargos públicos dependeria muito o futuro da participação feminina e a grande maioria de nós sabia bem disto. Se ficasse demonstrada nossa competência e eficiência as portas estariam abertas para que as mulheres disputassem cargos em condições de igualdade, se fracassássemos por qualquer motivo isto seria utilizado como argumento contra qualquer candidata. Julgo que cumprimos nossa missão neste aspecto e tanto como delegada quanto deputada estadual espero ter contribuído para superar preconceitos.

Há, contudo, um aspecto negativo a ser considerado nesta igualdade de condições de disputa que começa a surgir e que de certa forma é justamente reflexo deste avanço. Este perigo a ser evitado é a dissolução da identidade própria da mulher na política, a qual se reflete na sua imagem, nas suas bandeiras, nas suas plataformas políticas e até nas suas bases eleitorais.

Boa parte das mulheres que exerceu este papel de pioneira tinha algum tipo de ligação com as mais variadas lutas das mulheres, igualdade de direitos, movimentos de mulheres que faziam reivindicações ligadas ao papel de mãe " como escolas, creches, postos de saúde " e, como no meu caso, o combate à violência contra a mulher. Muitas destas bandeiras podem acabar sendo relegadas a um plano inferior na medida em que ao serem vista como candidatas "normais" se deixe de lado as reivindicações especificamente femininas.

Com certeza ocorreram muitos avanços na situação geral da mulher enquanto cidadã, mãe, trabalhadora, esposa e política. Porém, está bem longe de a bandeira da igualdade de direitos ser assegurada, assim todas estas bandeiras históricas que marcaram a atuação feminina a frente do Estado precisam ser atualizadas, trazidas a um novo patamar, mas não podem ser esquecidas ou diluídas em uma plataforma genérica.

Não se trata de reeditar discursos que já não tem correspondência na realidade, mas sim de fazer um balanço das conquistas e avanços, um inventário das lutas que ainda devem ser travadas e o estabelecimento de um novo programa. No meu caso específico de luta pelo fim da violência contra a mulher, apenas para citar um exemplo, penso que a principal preocupação deve ser garantir à mulher condições de independência econômica, através da formação profissional, incentivo à formação de cooperativas e outras ações que dêem às esposas agredidas condições de escapar da tutela e dependência do marido agressor.

*Rosmary Corrêa, a Delegada Rose, é deputada estadual pelo PSDB e membro da Comissão de Segurança Pública da Alesp. Foi a titular da primeira Delegacia de Defesa da Mulher.

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