A diversidade de comentários sobre a ocupação até alguns dias atrás de algumas favelas do Rio de Janeiro por tropas do Exército revela o quanto a medida é capaz de gerar controvérsia. Igualmente curiosa é a quase total polarização da opinião dos analistas " em sua grande maioria críticos da decisão " e da população " visto que a presença do exército nas ruas obteve aprovação de mais de 80% da população. Antes de mais nada este distanciamento completo entre a opinião dos analistas e da população demonstra que há algo de errado não só com a segurança pública, mas com o discurso que se faz sobre o tema. Esta questão não pode ser negligenciada, porque a formulação de políticas públicas para um setor é reflexo direto daquilo que se pensa sobre ele e sobretudo sobre o que a respeito do assunto falam os segmentos mais organizados da sociedade e os especialistas do setor.O distanciamento entre a opinião pública e a opinião institucional " que o caso da presença do Exército nas ruas do Rio ou a progressão de pena para crimes hediondos ressaltam " mostra que falta ao país um novo discurso e uma nova análise das questões de Segurança Pública porque o discurso que há por aí não é capaz mais de obter consenso junto à população. E não é difícil entender porque isto está acontecendo, como tenho dito em inúmeras oportunidades, já que muito pouco se refletiu sobre o assunto nas últimas décadas limitando-se a repetir conceitos de outras épocas, outras situações e outros cenários. A polícia " tanto civil como militar " tem sido a grande vítima desta repetição dos velhos discursos do período de exceção, ignorando o sentido totalmente diverso. Já passou da hora de deixar de lado as hipocrisias e deixar bem claro que as forças de segurança em um regime democrático não podem e não devem ser tratadas como adversárias e órgãos de repressão política, mas sim que elas são um dos principais esteios da democracia. Qualquer tentativa de atacá-las e desarmá-las " inclusive no sentido literal -, é colocar em risco o Estado de Direito e fragilizar toda a sociedade. A mesma reflexão deve ser feita em relação ao Exército. Certamente a ocupação das favelas é uma medida extrema para momentos extremos, não pode ser utilizada como um procedimento de rotina, mas haverá casos igualmente extremos nos quais isto será necessário. É essencial, em particular, debelar a todo custo qualquer tentativa de controle de território por parte do crime organizado, grupos extremistas ou grupamento semelhante; e a despeito do que dizem os analistas esta questão é também uma das funções do Exército sim, para a qual deveria inclusive haver mais treinamento específico, ainda que, como disse antes, é uma aplicação emergencial para casos extremos que tanto não deve ser descartada como não deve ser usada de forma cotidiana. Algumas pessoas poderiam argumentar que a opinião pública tende a adotar posições extremas nestas questões de segurança e, portanto não serviria como referencial adequado por estar sujeita a certo choque emocional causado por alguns fatos explorados pela imprensa. Como exemplo disto citaria os altos índices de aprovação da pena de morte, trabalhos forçados, prisão perpétua e casos similares. Aos que defendem a tese de que a sociedade não é capaz de decidir por si o que é melhor para ela, respondo que é justamente a incapacidade dos "especialistas" em articular um discurso democrático e moderno sobre segurança pública, a revolta da sociedade contra as tentativas de torná-la indefesa contra as agressões, em particular mas não apenas do crime organizado, a rotulação de tantos policiais dedicados tratados como adversários e não parceiros, a patrulha ideológica contra inúmeros homens públicos que se preocupam com a defesa da sociedade, enfim toda estas circunstâncias que impedem um debate sério e sem hipocrisia do problema é que gera na sociedade desamparada a defesa das opiniões extremas.*Rosmary Corrêa, a delegada Rose, é deputada estadual (PSDB) e membro das Comissões de Segurança Pública e Direitos Humanos.