Tecnologia e conteúdo devem assegurar a TVs Legislativas o caráter de emissoras públicas


23/09/2004 20:47

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Auro Augusto Caliman, secretário geral Parlamentar da Assembléia Legislativa e deputado  Romeu Tuma<a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/hist/tvauro.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a> Rodrigo de Lucena, da TV Assembléia de Minas Gerais<a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/hist/TVRodrigo.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a> Maurílio Maldonado, Auro Augusto Caliman, deputado Romeu Tuma, Rodrigo de Lucena e Tom Figueiredo, diretor de Comunicação da Assembléia paulista<a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/hist/tvmesa.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a> Laurindo Leal Filho, professor da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo<a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/hist/TVLaurindo.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a> Leonel da Luz, consultor de broadcasting <a style='float:right;color:#ccc' href='https://www3.al.sp.gov.br/repositorio/noticia/hist/TVLeonel.jpg' target=_blank><i class='bi bi-zoom-in'></i> Clique para ver a imagem </a>

Tecnologia e demarcação de um espaço dedicado ao cidadão: essa parceria decisiva para o desenvolvimento dos canais de televisão mantidos pelos parlamentos brasileiros esteve em discussão no seminário "TV Legislativa: um canal de inclusão social", realizado nesta quinta-feira, 23/9, na Assembléia Legislativa de São Paulo.

"As TVs Legislativas, a partir da sua gestão por parlamentares, que são representantes da sociedade, assumem um papel público importante", afirmou Laurindo Leal Filho, professor da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo e um dos maiores especialistas em televisão. Ele encara a TV como um aliado na restauração do espaço público, invadido tanto pelo Estado como pelos interesses comerciais, ao longo do tempo. "A TV comercial tem a lógica da exclusão, porque o capitalismo é excludente, quem não consome não é cidadão".

O papel de uma emissora que tem seu controle e conteúdo nas mãos da sociedade organizada seria "incluir quem não consome mas é cidadão e precisa ver atendidas suas necessidades de cidadania e socialização de valores culturais", disse Laurindo Leal. Ele considera a BBC de Londres um modelo bem-acabado de emissora pública independente, distante tanto do Estado como da iniciativa privada. Por outro lado, fez restrições à maneira como opera a TV Cultura de São Paulo, que, gerida por uma fundação de direito privado, é institucionalmente pública, "mas derrapa na questão do controle, porque recebe recursos apenas do governo". A televisão pública inglesa é financiada por uma taxa paga pela população que possui aparelhos de televisão.

Recurso à tecnologia

Transmitidas apenas para os usuários de tevês por assinatura, as TVs Legislativas podem ter seu alcance aumentado com o recurso à tecnologia. Essa possibilidade ficou clara na exposição do consultor de broadcasting Leonel da Luz, que apontou a Web como uma parceira viável nessa tarefa.

"É quase um outro canal de transmissão de conteúdo, que permitiria aumentar bastante o alcance dessas emissoras", ele avaliou. Segundo dados apresentados por Leonel, o Brasil tem 3,7 milhões de assinantes de TV fechada e 19 milhões de usuários de Internet, dos quais 1,4 milhão com acesso por banda larga.

O consultor mostrou aos participantes do seminário um modelo de portal que, com a transmissão de imagens, coloca ao alcance da mão dos internautas, por exemplo, selecionar e reunir, a partir de um vídeo de longa duração, apenas os trechos que sejam de seu interesse.

Abertura

Também para aumentar seu alcance, "as TVs Legislativas precisam abandonar o gueto do cabo e passar para as ondas eletromagnéticas dos canais abertos", propôs Laurindo Leal Filho. A proposta de abertura dos canais legislativos tem o apoio do deputado Romeu Tuma (PPS). "Os canais comerciais operam por concessão do poder público, e nada mais justo que todos os Legislativos tivessem um canal aberto", afirmou o parlamentar.

Tuma também propôs a cessão de 10 minutos do noticiário radiofônico Hora do Brasil para a transmissão de notícias dos parlamentos estaduais. Representante da Assembléia Legislativa paulista no conselho da Associação Brasileira de Televisões e Rádios Legislativas (Astral), ele participou da abertura do evento, promovido pela Secretaria Geral Parlamentar da Assembléia Legislativa de São Paulo.

"A facilitação do acompanhamento da atividade parlamentar, por parte dos representados, amplia sua capacidade de participação política", avaliou o secretário geral Parlamentar Auro Augusto Caliman. Ele também participou da cerimônia, que contou, ainda, com a presença do presidente do Instituto do Legislativo Paulista, Maurílio Maldonado; do presidente da Astral, Rodrigo de Lucena, da TV Assembléia de Minas Gerais; e do diretor de Comunicação da Assembléia paulista, Tom Figueiredo.

"Na TV Assembléia de São Paulo nós fizemos a opção mais difícil, mas correta: a de manter o foco na atuação legislativa, nas idéias e posições que os parlamentares têm a debater", afirmou Figueiredo. A TV Assembléia também colocou na base de sua prática de comunicação o princípio da inclusão social. Por solicitação dos portadores de deficiência auditiva, a emissora implantou o sistema de closed caption, um recurso da tecnologia digital que possibilita o acompanhamento de programas de televisão por meio de legendas ocultas, on line ou off-line, substituindo o papel do áudio.



Surgimento das TVs legislativas torna públicas as decisões políticas

O secretário geral parlamentar da Assembléia, Auro Caliman, no seminário "Tv Legislativa: um canal de inclusão social" comentou as mudanças sentidas nas casas legislativas após o aparecimento dos canais de Tv legislativos. Eis a íntegra de sua fala:

"Tal qual os senadores no período imperial, tudo indica que os canais de TV do Legislativo obtiveram, também, mandato vitalício.

A propósito, gostaria de registrar o que escreveu Ramiro Batista Abreu, diretor de Comunicação Institucional da Assembléia Legislativa de Minas Gerais, sobre a chegada das TVs Legislativas. A sua impressão, certamente, foi também a de muitos outros profissionais e telespectadores. Na apresentação do livro "Comunicação e política nos canais de televisão do Poder Legislativo no Brasil", de autoria da jornalista e acadêmica Letícia Renault, resultante de sua dissertação de Mestrado em Comunicação Social, Abreu observa:

"Quando a TV Senado iniciou suas transmissões, em 1996, o jornalista Boris Casoy usou o seu bordão para enfatizar que era uma vergonha a utilização de recursos públicos para divulgação dos atos legislativos por meio de uma tevê própria. No auge da teoria do Estado mínimo, quando era moda criticar o governo por se imiscuir em atividades que não seriam de sua alçada, o âncora sugeria que os deputados não deveriam avançar sobre o que a iniciativa privada já fazia, a seu ver, com competência - a cobertura dos atos dos três Poderes.

A grande imprensa, de uma forma geral, ignorou o surgimento da emissora, naquele simplismo típico que caracteriza em grande parte a cobertura dos trabalhos legislativos. Alguns outros setores da mídia, naquele tipo de cacoete jornalístico que tende a ver oportunismo em qualquer ação dos políticos, só registraram a estréia da TV Senado como outra oportunidade de cutucar os parlamentares. Passaram ao largo de uma discussão profunda sobre o significado do novo fenômeno que viria, sim, provocar modificações no interior dos parlamentos e colocar em pauta a discussão sobre o caráter público dos veículos de comunicação."

E o significado do novo fenômeno a provocar mudanças no interior das Casas Legislativas revela uma política de aproximação com a sociedade; o entendimento de que, na democracia representativa, os representados devem ter facilitado o acompanhamento da atuação parlamentar dos seus representantes; passa pela construção da cidadania ativa no próprio espaço público de funcionamento do Legislativo; amplia a possibilidade de comunicação na política, implantando-se quase que um acesso eletrônico ao Parlamento; e provoca, também, o desvelamento pela "imprensa" de um outro Poder Legislativo, que pode, agora, não mais ficar refém de uma parcial versão dos seus trabalhos, das suas atividades.

Evidentemente, não estamos aqui para incensar as TVs Legislativas, mas para refletir e registrar as enormes diferenças de interesses que há entre a esfera pública e a privada na área de comunicação política; sobre o aprendizado na construção das TVs Legislativas; a influência impactante das TVs legislativas na mudança de comportamento parlamentar no decorrer dos trabalhos legislativos.

Decidir publicamente faz parte da singular metodologia de trabalho do Legislativo. Neste Poder, há uma peculiar separação entre os momentos de produção e a encenação das decisões para consecução das suas funções precípuas. Tércio Sampaio Ferraz observa que: "as decisões podem ser tomadas em reuniões de gabinete, em comissões técnicas, mas a encenação da tomada de decisão é pública, possibilitando ao povo uma participação política atuante dentro do sistema".

Pois bem. Com as TVs Legislativas, os parlamentares passam a ter a companhia permanente dos telespectadores, quase que com o dom da ubiqüidade a vigiar a encenação do processo decisional no Poder Legislativo, que sempre se dá publicamente. Enfim, "a câmera em ação operou no político a possibilidade de pressentir o telespectador", como salienta Letícia Renault".



Ferramenta importante

O segundo bloco do seminário, coordenado pelo diretor de comunicação da Assembléia paulista, Antônio Figueiredo, iniciou-se com um vídeo no qual a diretora da TV Senado, Marilena Chiarelli, que não pôde estar presente ao evento, contou parte da trajetória da emissora. Para ela, a TV Senado é uma importante ferramenta de inclusão social, mesmo não sendo transmitida por canal aberto. "A recepção por antena parabólica nos permite atingir 48 milhões de brasileiros. Esse número é bastante expressivo, visto que a média nacional de consumo editorial é de apenas 28 exemplares a cada mil leitores". Para ampliar o alcance da TV Senado, Marilena Chiarelli acredita que será decisiva a transmissão do sinal em UHF, pois possibilitará o direito à informação a pessoas que não possuem outros meios para tanto. "Nossa programação da abrange temas que dificilmente seriam discutidos em outras mídias", ressaltou.

Rodrigo Lucena, presidente da Associação Brasileira de Televisões e Rádios Legislativas (Astral), falou de sua experiência à frente da Rádio e Televisão da Assembléia Legislativa mineira, primeira emissora legislativa do país. "Iniciamos nossas transmissões em 1995, basicamente com a cobertura das atividades parlamentares. Na ocasião, sentimos a necessidade de reafirmar à população a importância do Poder Legislativo, que passara por décadas de letargia durante a ditadura militar". Lucena ponderou que o fato de a TV Assembléia mineira estar transmitindo em canal aberto não contraria a legislação federal. "Com um pouco de boa vontade na interpretação da norma e, fazendo-se um paralelo à Lei de Responsabilidade Fiscal, veremos que o Poder Legislativo é parte integrante do estado e, mesmo sem personalidade jurídica própria, pode contar com uma emissora em canal aberto".

A diretora da TV Câmara, Sueli Navarro, resumiu a história do veículo, que, inicialmente, resumia-se às transmissões de Plenário. "Com o tempo, percebemos a real importância da TV e necessidade de aprimorar sua qualidade técnica como forma de atrair o público". A produção, que a princípio era concentrada no jornalismo, abriu-se para outros dois núcleos: o de programas e entrevistas e o de documentários. Conforme disse a diretora, até o início de 2005, toda a grade será remodelada, com novidades como o "Bastidores", programa centrado no que se passa nos corredores do parlamento. "Todo o trabalho de lobby, que é legítimo, acontece fora dos plenários. Enfocando esse assunto, o espectador passará a perceber porque alguns projetos demoram anos até ser votados".



TV Assembléia visa soluções para ampliar sua programação



"Nossa TV é uma emissora que fez do talento uma superação da dificuldade física e, muitas vezes, da dificuldade de alocação de recursos", afirmou Tom Figueiredo, diretor do Departamento de Comunicação da Assembléia Legislativa, referindo-se ao fato de que a novidade do uso desse tipo de mídia para a divulgação das atividades legislativas não esbarra somente no processo de adaptação de espaços, mas também de ter recursos suficientes, cuja previsão começa a ser muito recente e, de certa forma, ainda insuficiente.

Depois da exibição de vídeo institucional sobre a programação da TV Assembléia, o diretor de Jornalismo, James Rúbio, fez uma preleção sobre a superação dos obstáculos para ampliar a programação e fazer com a que TV institucional, apesar das limitações para ser competitiva, possa se tornar atrativa para o telespectador.

Com a ampliação da programação, incluindo um programa esportivo - que por conta das olimpíadas e paraolimpíadas teve este ano diversos atletas e personalidades ligadas ao esporte como convidados - sabe-se que a audiência aumentou. Entretanto, hoje é difícil medir essa audiência, por ser um processo caro, processo que demanda muitos recursos, cuja aplicação prioritária ainda é o aperfeiçoamento da TV atual. "É impossível mensurar o número de telespectadores da TV Assembléia; isso não é feito porque é preciso um grande desembolso", disse Rúbio.

As dificuldades financeiras também limitam o equipamento e a quantidade de profissionais: hoje, são 20 jornalistas, 3 editores, 5 repórteres, 3 câmeras estáticos, 3 câmeras de plenário e 2 câmeras volantes, e equipamentos limitados. "É muito pouco para o que projetamos. Nossa intenção é a ampliação da equipe e a obtenção de mais equipamentos."

Outra dificuldade para a ampliação da programação - e conseqüentemente, do alcance da TV institucional do Poder Legislativo - é o fato de que o canal é dividido entre a programação da TV Assembléia e da TV Câmara. Ele defende que haja canais separados, para que a programação não seja prejudicada.

Financiamento e independência

O professor da Escola de Comunicações e Artes da USP, o jornalista Laurindo Lalo Leal Filho, participou dos debates destacando que as TVs legislativas podem ser espaços de revigoramento dos serviços de rádio e televisão públicos. "As idéia de serviço público de rádio e televisão está consagrada na Constituição, porém resta ainda implantá-la."

As formas de financiamento das TVs legislativas deram a tônica dos debates. Apesar de não ser contrário ao apoio cultural, Lalo ponderou sobre os efeitos de propaganda no conteúdo e forma da programação. Segundo ele, a lógica do consumo acaba inevitavelmente se impondo ao conteúdo da programação. "Quanto à forma, é perceptível que spots de propaganda comercial impõem um ritmo que contamina a programação, determinando os tempos e a lógica de ganhar o telespectador pela emoção, ao invés de despertá-lo para a reflexão".

O professor da Eca comentou outras fórmulas de financiamento, como a que é utilizada pela BBC de Londres, baseada em taxas pagas pelos cidadãos para ter acesso á rádio e à TV. Entretanto, diz ele, no Brasil falar de taxas não parece ser um caminho aceitável.

"Para se ter uma idéia, as TVs a cabo atingem somente a 3,5 milhões de usuários. A realidade da distribuição de renda no país não permite esse modelo de taxas, que seria o ideal." Lalo apontou para alternativas que vão desde a orientação de uma parte das verbas de propaganda das empresas públicas e estatais para as tvs públicas; mecanismos de renúncia fiscal; e mesmo a taxação das Tvs comerciais pelo uso dos espectros eletromagnéticos, tese fortemente combatida pelas emissoras comerciais.

O secretário geral parlamentar da Assembléia paulista, Auro Caliman, enfrentou o tema com uma consideração. Apesar de o apoio cultural ser uma opção para o financiamento das tvs legislativas, inclusive para a TV Assembléia, a seu ver, o procedimento deve ser descartado de antemão, como um preço a ser pago para a manutenção de sua independência.

A independência está no centro do jogo. Para Tom Figueiredo, ainda está por ser explorada as vias alternativas de financiamento, em meio a inúmeras opções postas pela modernidade, sem perdermos aquilo que deve ser o caráter fundamental das tvs legislativas, a independência.

O deputado Romeu Tuma (PPS) fez coro aos seus pares da mesa, lembrando que por ser o Legislativo o poder mais democrático, deve estar isento de influências, sejam econômicas ou de interesses de grupos, em suas programação televisiva. "O desafio do parlamento é transformar o conceito da opinião pública sobre as atividades parlamentares. O papel da TV Legislativa é apresentar o parlamento como ele é. Quanto mais forte forem as TVs mais condições terão os parlamentares de mostrar o seu trabalho e prestarem contas aos cidadão sobre seus mandatos", disse Tuma.

Ainda sobre a questão do financiamento, Rodrigo Lucena, da TV Legislativa de Minas Gerais e representante da Astral, defendeu a tese do financiamento público exclusivo. "Vincular setores econômicos ou sociais, ou marcas às Tvs, mais do que ter implicações sobre as questões de forma e conteúdo das programações, é um problema de natureza ética". Para ele, a solução para o financiamento deve ser procurada na divisão do bolo das verbas publicitárias do poder público. Ele defendeu ações legislativas para sedimentar essas alternativas.

alesp